Internacional

Leonardo Lorenzoni assume cargo de Coordenador Ofensivo da Seleção Sueca de Flag Football

foto: arquivo pessoal/leonardo lorenzoni

O flag football brasileiro ganha mais um representante no cenário internacional. Leonardo Lorenzoni, ex-head coach do Coritiba Crocodiles e nome consolidado na modalidade no Brasil, acaba de assumir o cargo de Coordenador Ofensivo da Seleção Sueca de Flag Football. Em entrevista exclusiva, ele falou sobre o convite para integrar a comissão técnica, os desafios da adaptação ao esporte na Suécia e seus objetivos para a nova jornada.

Oportunidade na Suécia

A oportunidade surgiu por meio do novo head coach da seleção sueca, o mexicano Carlos Barillas, que buscava profissionais que respirassem flag football e pudessem contribuir para a evolução da equipe. “Eu já havia entrado em contato com a federação sueca, me disponibilizando para ajudar no que pudesse, e eles recomendaram meu nome. Tive a chance de ser chamado para o cargo de coordenador ofensivo, e fico feliz que minha experiência prévia como treinador tenha me permitido essa oportunidade”, contou Lorenzoni.

Leonardo Lorenzoni (foto: arquivo pessoal)

Mesmo antes de assumir a posição, o treinador já vinha acompanhando a comunidade do flag sueco. “Quando soube que iria me mudar para a Suécia por conta do meu trabalho, comecei a pesquisar mais sobre o flag daqui. Fui ao Mundial da Finlândia no ano passado e assisti a um jogo da Suécia junto com a torcida, o que me trouxe algumas conexões e me permitiu ficar de olho nas notícias do esporte no país”, explicou.

Desafios e adaptação ao flag sueco

Entre os desafios iniciais, Lorenzoni destaca a barreira cultural e linguística, mesmo considerando que a maioria dos suecos fala inglês fluentemente. “Quando estamos em posição de liderança e ensino, é essencial encontrar as formas mais acessíveis e claras de transmitir conhecimento. Falar inglês durante os treinos me faz sentir que estou desenvolvendo uma nova ‘personalidade’ como coach. É um processo que me obriga a repensar minha didática e minha forma de comunicação”, revelou.

A rotina de trabalho na seleção tem sido intensa. Em uma iniciativa ousada, a comissão técnica organizou training camps abertos em três cidades suecas no mesmo fim de semana, passando por Estocolmo, Gotemburgo e Kristianstad. “Viajei mais do que a distância de Porto Alegre ao Rio de Janeiro em poucos dias, mas foi uma experiência enriquecedora para entender como o flag é jogado em diferentes regiões do país e como podemos estruturar nosso programa de treinamento”, comentou.

Metas e visão para o ataque sueco

O treinador tem uma visão clara para o ataque da Suécia: torná-lo mais versátil e eficiente. “A principal meta de um coordenador ofensivo tem que ser marcar o máximo de touchdowns possível. Quero trazer um pouco da mentalidade de flag que aperfeiçoei ao longo da minha carreira, respeitando o trabalho da comissão anterior e agregando ao desenvolvimento do esporte no país”, afirmou.

Além da parte técnica, Lorenzoni pretende contribuir para a formação da comunidade sueca de flag football. “Os times aqui jogam de maneiras muito diferentes entre si, e quero compartilhar ao máximo o que sei para ajudar no desenvolvimento dos clubes, sempre aprendendo com eles também”, pontuou.

Comparando a realidade sueca com o flag football brasileiro, ele destacou algumas diferenças. “A Suécia tem pouco mais de 10 milhões de habitantes e menos de 20 times masculinos no total, uma comunidade menor do que a de São Paulo, por exemplo. Mas o país consegue fazer muito com poucos recursos. A cultura esportiva sueca incentiva crianças a praticarem diferentes esportes desde cedo, o que traz jogadores com habilidades mais desenvolvidas. Além disso, eles não são imediatistas, o que contribui para um planejamento mais sólido e estruturado”, analisou.

Olho no Campeonato Europeu e no futuro

O primeiro grande desafio da nova comissão técnica será o Campeonato Europeu de 2025, em Paris, competição que pode ser um trampolim para futuras participações olímpicas. “Sabemos que o primeiro passo para chegar às Olimpíadas é fazer um bom torneio em Paris. Estamos assumindo a seleção no ano da competição, conhecendo os atletas e preparando a equipe em um tempo curto, mas esses desafios só me motivam a ser mais eficiente”, afirmou.

Entre as características do flag brasileiro que deseja implementar no estilo de jogo da Suécia, Lorenzoni destaca o drible e a habilidade dos jogadores brasileiros em conquistar jardas após a recepção. “Acho que esse aspecto pode elevar muito o nível do ataque sueco”, disse.

Ligação com o Coritiba Crocodiles e o flag brasileiro

Apesar da mudança para a Suécia, Lorenzoni segue vinculado ao Coritiba Crocodiles, onde agora atua como General Manager, auxiliando na estruturação e desenvolvimento do programa da equipe. “O Croco é uma família que sempre quer te ver bem, mesmo que seja longe. Ano passado, fiz um bate-volta para estar com o time na Super Final, e valeu totalmente a pena. Hoje, meu papel é ajudar na capacitação de novos treinadores e manter a organização do time de forma mais descentralizada”, explicou.

O impacto do seu trabalho segue sendo sentido no Brasil. “Tivemos um número recorde de 55 inscritos nas seletivas deste ano, o que mostra que estamos no caminho certo. Meu foco agora é compartilhar o que estou aprendendo na Suécia e ajudar o Croco a continuar crescendo”, afirmou.

Conselho para treinadores brasileiros

Sobre o sonho de atuar no exterior, Lorenzoni aconselha os treinadores brasileiros a expandirem seus horizontes. “O Brasil faz muitas coisas certas no flag, mas ainda temos muito a aprender. É essencial sair da zona de conforto e buscar entender diferentes formas de jogar e estruturar um time. O conhecimento sobre flag football ainda é muito informal, e conceituar melhor o esporte pode ajudar a fortalecer a modalidade no Brasil”, ressaltou.

Agora, com um novo desafio na Europa, Lorenzoni segue focado em sua missão na Suécia. “Meu objetivo é estruturar o programa da seleção e aprender o máximo possível nessa experiência. Estou motivado para essa nova fase e ansioso para ver o que podemos construir juntos”, finalizou.


Essa nova fase na carreira de Leonardo Lorenzoni não só fortalece sua trajetória internacional, mas também ajuda a projetar o flag football brasileiro no cenário global. Com um olhar estratégico e experiência consolidada, ele promete ser uma peça fundamental na evolução do esporte na Suécia e na Europa.

Confira abaixo a entrevista na íntegra

FFBR: Como surgiu a oportunidade de assumir o cargo de Coordenador Ofensivo da Seleção Sueca de Flag Football?

Leo Lorenzoni: A oportunidade veio através do convite do head coach Carlos Barillas. Ele acabou de assumir o comando da seleção masculina e me convidou para uma entrevista para o cargo de OC. Ele é um treinador mexicano com muita experiência no desenvolvimento de programas de futebol americano, começando do zero e estruturando os processos e culturas para formar uma base sólida para o longo prazo. Além disso, hoje ele trabalha diretamente ensinando crianças suecas a jogar flag, então, além de ser um grande gestor para a equipe, ele também é uma pessoa muito bem relacionada e com uma ótima visão de futuro.

Ele estava buscando por talentos na comissão técnica que respirassem o esporte. Eu já havia entrado em contato com o pessoal da federação sueca me disponibilizando para ajudar com o que pudesse e eles recomendaram a ele para me ligar e ver qual seria a melhor forma de trabalharmos juntos. Fico feliz que minha experiência prévia como treinador me permitiu ter a chance de ser chamado para ser coordenador ofensivo. 

Você já tinha algum contato prévio com o Flag Football sueco antes de aceitar o cargo?

Quando soube que iria me mudar para a Suécia por conta do meu trabalho, eu comecei a procurar mais sobre o flag daqui e a sua comunidade. Tive a oportunidade de ir pessoalmente ao mundial da Finlândia no ano passado e aproveitei a oportunidade para conhecer o pessoal da seleção sueca e assistir a um dos jogos junto com a torcida. Foi uma experiência legal, que me trouxe algumas conexões e que me permitiu ficar de olho nas notícias para ser considerado neste novo ciclo.

Qual é o maior desafio no processo de adaptação ao flag da Suécia?

Com certeza é o idioma e a cultura. Quando estamos em posição de liderança e de ensinar pessoas, é muito importante encontrar as maneiras mais acessíveis e claras de fazer o conhecimento ser transmitido e compreendido. Tenho sorte que o povo sueco é um dos povos mais fluentes na língua inglesa e não tive nenhum problema com jogadores nesse sentido, mas ainda me sinto um pouco perdido em encontrar a didática certa e a maneira de acessar os jogadores da mesma forma como estava acostumado no Brasil. 

Essa parte é até engraçada porque sinto que estou desenvolvendo uma outra “personalidade” como coach falando inglês. Muita gente fala que isso faz parte do processo de viver fora, mas nunca imaginei que seria aplicado ao flag também. Mas definitivamente uma oportunidade de ouro para eu pensar o que eu falo, como eu falo e qual o motivo de falar as coisas. Faz você repensar toda a estrutura de ensino e liderança e abre espaço para muita coisa nova. Afinal, a mensagem precisa ser passada de algum jeito e no fim do dia queremos fazer com que os jogadores sejam atletas e pessoas melhores.

Como tem sido sua rotina de trabalho na Seleção Sueca?

Estamos no processo inicial de definir a metodologia de trabalho para o curto, médio e longo prazo. As primeiras semanas foram caóticas, com os preparativos de cronograma, avaliação de sistema e finalização do que seria o playbook inicial para esse primeiro contato.

Estamos com a ideia ambiciosa de rodar training camps abertos nas três principais regiões do país em um único fim de semana. Então neste último fim de semana tivemos o mesmo treino sendo aplicado em Estocolmo na sexta à noite, em Gotemburgo no sábado e em Kristianstad no domingo. Viajei mais do que a distância de Porto Alegre até o Rio de Janeiro, mas foi muito legal para ter uma ideia de como o flag é jogado em cada região e como são as cidades. 

Nossa ideia é ter esses training camps abertos nessa primeira fase para avaliarmos o máximo de jogadores possível, espalhar mais a sementinha do flag para regiões que ainda são muito dominadas exclusivamente pelo futebol americano e trazer atletas até mesmo de outros esportes. Depois, naturalmente, vem a fase de preparação para o Campeonato Europeu de Paris, em setembro.

Quais são suas principais metas como Coordenador Ofensivo da seleção?

A principal meta de um coordenador ofensivo tem que ser marcar o máximo de touchdowns possível. Porém, para alcançar isso, eu tenho algumas ideias de como tem que ser o caminho. Tenho muito respeito pela comissão técnica que esteve aqui antes de mim, mas quero trazer para a comunidade sueca um pouco da mentalidade de flag football que eu conheço e aperfeiçoei ao longo da minha carreira. Eles possuem ótimos jogadores e estou ansioso para ver como podemos construir juntos um ataque versátil e potente.

Obviamente existe também a ideia de transformar a comunidade. Temos times e jogadores jogando de forma muito diferente entre si aqui na Suécia e quero compartilhar ao máximo o que eu sei sobre o esporte para auxiliar o desenvolvimento dos clubes. Isso tudo sem desmerecer o trabalho que eles já fazem e, claro, aprender com eles também.

Como você avalia o nível do Flag Football na Suécia e na Europa em comparação ao Brasil?

Eu tenho pouca amostragem para fazer uma comparação competente. Acho que com o tempo vou poder responder essa pergunta com mais qualidade. Mas, inicialmente, já percebi os desafios de trabalhar com um país menos populoso. A Suécia tem pouco mais de 10 milhões de habitantes e menos de 20 times masculinos no total. Estamos falando de uma comunidade que em sua totalidade é menor do que a comunidade de flag paulista.

Porém, é nítido o quanto eles conseguem fazer muito com menos. A cultura sueca incentiva as crianças a jogarem diferentes tipos de esporte ao mesmo tempo desde pequenas, então existe uma abertura maior à prática de algo tão “diferente” como o flag football. Ao mesmo tempo, eles já chegam com diversas técnicas e características mais maduras para aplicarmos ao esporte. Então acho que muito do potencial brasileiro fica oculto pelo tanto que o futebol domina a formação de atletas do Brasil.

Outra característica cultural que já percebi aqui também é a paciência. Eles não são, por cultura, um povo imediatista. E isso aplicado ao esporte traz a paciência necessária para criar a determinação ideal num processo de preparação competitiva. Faz muito frio por muito tempo do ano, sem essa determinação consolidada na mentalidade não seria possível manter um crescimento de performance.

A seleção sueca tem alguma grande competição em vista?

Queremos colaborar com algumas seleções europeias ao longo do ano para nos testarmos, mas obviamente a grande competição que temos em vista é o Campeonato Europeu 2025 em Paris, no mês de setembro. Todo país que possui um programa competitivo está de olho nas Olimpíadas e nós sabemos que o primeiro passo para chegar lá é fazer um bom torneio em Paris. 

Não vai ser um torneio fácil e o nível da Europa é muito alto e equilibrado. Somos uma comissão técnica assumindo no ano da competição e tendo que conhecer os atletas da comunidade e preparar eles para competir num espaço pequeno de tempo. Mas ter esses desafios todos só me deixa mais motivado para ser mais eficiente com o tempo e o plano que temos. Vivi o mundial da Finlândia em 2024 e tive pra mim que precisava estar envolvido com esses grandes torneios para poder evoluir como treinador. Esse desafio logístico já é prova de que precisarei me reinventar para poder preparar o time como eu gostaria.

Existe alguma característica do flag brasileiro que você pretende implementar no estilo de jogo da Suécia?

Acho que existem várias coisas da comunidade brasileira que quero trazer para a Suécia enquanto cultura de esporte. Mas especificamente em relação ao trabalho de dentro de campo e ao ataque, acho que quero trazer as referências de dribles. Temos muitos jogadores brasileiros talentosos em conseguir jardas após a recepção e acho que o flag sueco pode ter um bom ganho de desempenho se eu conseguir trazer um pouco disso para cá.

Você ainda segue no comando do Coritiba Crocodiles? Como está a sua relação com o time após essa mudança?

Eu sou muito grato pelo fato do Croco ser o tipo de família que sempre quer te ver bem, mesmo que seja longe. Ano passado fiz a loucura de viajar para o Brasil num bate-volta para estar com o time masculino na Super Final e acho que valeu totalmente a pena. Esse ano eu dei um passo necessário para trás e dei lugar a novas lideranças técnicas assumirem o rumo do projeto. Eu sempre fui um líder muito centralizador e minha missão agora é que a equipe continue mantendo um nível excelente de organização só que de forma descentralizada.

Estou atuando remotamente como General Manager, que é um nome chique para dizer que estou aconselhando e cuidando da visão de futuro do programa. Eu não consigo mais estar presente no cotidiano e o fuso horário não me permite ter uma relação próxima com o elenco. Mas estou bastante empenhado na formação de novos treinadores e na capacitação dos treinadores veteranos para que eles possam fazer um trabalho juntos muito melhor do que eu poderia fazer sozinho.

Estou bem animado com essa possibilidade porque já tivemos um número recorde de inscritos nas seletivas desse ano: 55 pessoas. Quando eu penso que 55 pessoas dedicaram tempo da vida delas para tentar fazer parte da nossa equipe de flag, vejo que estamos na direção certa. O Croco já possuía um time de desenvolvimento e agora o meu foco está 100% na capacitação e organização de processos internos para termos o máximo de eficiência na forma como trabalhamos com tanta gente ao mesmo tempo.

Seguirei trabalhando de perto com eles e compartilhando as experiências que vivo por aqui. Quem sabe eu não apronte mais uma vez e resolva fazer um bate-volta surpresa para estar junto na sideline em um campeonato? De qualquer forma, faço questão de levar alguma coisa com o símbolo do Croco para todos os eventos esportivos que vou aqui, então me sinto parte da instituição como sempre e o tempo todo.

O cargo na Seleção Sueca abre novas portas para você no cenário internacional? Tem planos de seguir carreira fora do Brasil a longo prazo?

Meu foco neste momento está 100% na criação e estruturação do programa da seleção sueca. O coach Carlos é um grande mentor e eu sei que preciso aprender e amadurecer muito nessa posição antes de pensar em qualquer coisa além disso. 

Sempre falo para os atletas que eles não irão conquistar nada se antes disso eles não acreditarem de que são capazes de conquistar. Acho que estou tentando usar a mesma mentalidade: não tenho a mínima chance de ter sucesso nesse cargo se eu estiver pensando no futuro ou em outras possibilidades. Estou feliz onde estou e bastante motivado para não pensar sobre mais nada além disso. O Crocodiles obviamente divide o meu coração, mas acho que encontramos uma forma de trabalho que está sendo muito proveitosa para todo mundo, então o meu foco é continuar como estou e aprender o máximo possível com esta experiência.

Qual conselho você daria para outros treinadores brasileiros que sonham em atuar no exterior?

Acho que a gente no Brasil está fazendo muito mais coisas certas do que nos damos créditos. Uma das coisas mais engraçadas que vivi até agora por aqui foi ver que no aquecimento eles chamavam de “Carioque” o exercício que muitos do Brasil chamam de “Carioca”. Até perguntei o motivo e não souberam dizer exatamente o porquê, mas me pareceu que foi o tipo de coisa que a cultura brasileira influenciou indiretamente.

Mas obviamente existe também muita coisa a ser melhorada e acho que o que mais abriu meus olhos para essas oportunidades aqui fora foi o entendimento de que eu preciso aprender mais. Conheço muitos treinadores brasileiros que falam e agem de dentro de uma zona de conforto que pode ser perigosa para o desenvolvimento brasileiro. Tem muitas maneiras diferentes de se jogar flag no mundo e muitas maneiras diferentes de se construir a cultura de um time. Quanto mais a gente se abre para essas diferenças, mais a gente tem repertório para construir o que precisamos com as partes que queremos.

Também acho que o conhecimento sobre flag é muito informal. Temos muito material sobre futebol americano, mas sobre flag existe muito pouco. Conceituar as coisas, pensar os motivos pelos quais fazemos o que fazemos e dar um passo para trás e analisar nossas próprias “manias” são exercícios que estou tentando desenvolver com a comissão técnica do Croco nas minhas mentorias e acho que é um bom caminho para quem quiser chegar longe.

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